segunda-feira, 5 de abril de 2010

E se ela fosse a caçadora???

Arrumou-se como a muito tempo não se arrumava, escolheu seu melhor vestido, sua melhor sandália, seu melhor batom, seu melhor perfume, sua melhor lingerie(...) Decidiu que hoje sairia à caça, havia cansado de ser sempre a presa e desejou por pelo menos uma noite ser a caçadora. Sim, ela hoje estava vestida para matar, ou como suas amigas preferiam denominar hoje ela estava pro "crime".

No exato momento em que ela tirou o carro da garagem o relógio do painel marcava 22:22, alguém deveria estar pensando nela naquele exato momento, ela riu de si mesma por acreditar numa surperstição inútil. Só então deu-se conta de que já estava um pouco atrasada, já que mesmo que corresse, jamais conseguiria chegar ao pub na hora com que marcara de se encontrar com seus amigos , afinal de contas o trânsito às sextas feiras a noite eram caóticos.
Apesar da insistência de seus amigos, ela preferiu ir sozinha no seu carro, afinal queria deixar de ser a caça e elevar-se à condição de caçadora, logo dirigir seu próprio carro ajudaria em parte nessa troca de papéis.

Chegou ao estacionamento do pub por volta das 23:10, por ter seu nome na reserva antes das 23:20 estava sendo encaminhada para a mesa onde encontrar-se-ia com os amigos, um pouco atrasada mas todos entenderiam muito bem o motivo da demora, já que ela havia caprichado bastante na sua produção. Enquanto caminhava em direção à mesa, todos os olhares do lugar se voltaram para ela. Linda, radiante, sensual,confiante, determinada, bem resolvida...essa era a imagem que ela passava a todos que estavam naquele lugar. Quando finalmente iria sentar-se ao lado dos amigos, ela olha discretamente para o relógio na parede do pub e percebe que ele marcava exatamente 23:23. Ela sorriu discretamente e pensou na possibilidade de que alguém naquele exato momento estivesse pensando nela, foi então que ela concluiu se tratar de uma grande bobagem.

Naquela noite, ela parecia ter desviado todos os olhares para si. Até suas amigas sentiam-se incomodadas e ao mesmo tempo hipnotizadas com uma espécie de luz e beleza que ela irradiava e acabava ofuscando todas as demais.
Foi então que no meio de tantos rostos desconhecidos nas mesas ao lado, ela avistou um rosto familiar, pensou se tratar de um delírio louco de sua imaginação, mas logo concluiu que se tratava do Carlos Henrique, um ex-namorado da época de cursinho. Depois que eles terminaram o namoro, ele se mudara para outra cidade, desde então ela tentou manter contato com ele algumas vezes, todas sem sucesso. Ela percebeu que naquele momento ele só tinha olhos pára ela, era como se ela fosse um imã gigante...por mais que ele tentasse disfarçar, o olhar já o entregara.Um pouco mais discreta, ela também não conseguia parar de olhá-lo, talvez ele fosse a presa que precisava para essa noite...foi então que ela resolveu retribuir os olhares e incentivar uma possível reaproximação.

O garçom veio até à mesa onde ela estava para entregar um drink e juntamente com ele um bilhete, os olhares curiosos sobre o bilhete talvez tivessem intimidado ele. Ela dispensou o drink mas respondeu o bilhete.O fato é que em menos de 20 minutos ela havia decidido se retirar da mesa, com a desculpa de que estava meio indisposta e precisava ir pra casa. Dispensou a companhia dos amigos e alegou que não era nada demais.
Ao sair do pub mal conseguia se equilibrar nos saltos, não exagerara na bebida, o motivo talvez seria o nervosismo. Pois no bilhete que respondera, acabara de combinar o encontro que esperara por tanto tempo.

Se encontrou com Carlos Henrique no estacionamento, lá ficou decidido que eles iriam no carro dela, e que ela iria dirigir. Ele não entendeu muito bem as condições os motivos pelo qual ela preferia pagar de "homem" na relação. Até o Motel ficou a critério dela. Ela escolheu o melhor motel e a melhor suíte da região. Ele não entendia porque ela agia daquela forma. O fato é que ele sentisse bastante intimado(...)

Na cama eles se amaram como nos velhos tempos, era como se a sintonia da época de namoro nunca tivesse sido interrompida, uma perfeita afinidade entre os corpos e as almas. Ele adormeceu...foi então que ela procurou sair na ponta dos pés para não acordá-lo. Mas antes de ir embora, ela escreveu de batom vermelho,no espelho,um número de telefone (provavelmente o seu número) e fez questão de deixar o pernoite pago.
Ao acordar e se dar conta de que ela já não estava mais ali, ele viu o numero escrito no espelho e sorriu, resolveu anotá-lo no celular para poder ligar mais tarde. Ao pedir a conta, descobriu que ela havia se encarregado de pagar tudo. Ele ficou um pouco intrigado com a atitude dela(...)

Ao chegar em casa...ele decide ligar para o número que ela deixou escrito de batom...estranho... o número chamava...chamava...e ela não atendia. Talvez ela estivesse dormindo...ou tivesse deixado o celular dentro do carro. O fato é que ele insistiu em ligar mais tarde...e novamente o telefone chamou mas ninguém atendeu....foram dias discando para esse mesmo número.Ele não entendia o motivo dela deixar um número se não iria atender...logo concluiu que talvez algo tivesse lhe acontecido(...)

Do outro lado da linha ela se divertia ao ver a série de tentativas frustradas e o grande número de mensagens de voz na sua caixa postal. Sim, agora os papéis se inverteram, ele era a caça e ela a caçadora...

(Fabiana Nonaka Ferraz)

E se ela fugisse???

Os anos haviam passado depressa demais para aquela típica garota vinda do interior. A garota tímida de olhar inocente e de gestos delicados deu lugar à uma mulher determinada, de olhar enigmático e personalidade forte. Talvez a dureza da vida tivesse se encarregado de transformar aquela garota sonhadora e desengonçada em uma bem-sucedida mulher de negócios.

Ela sempre procurou passar a todos à sua volta, uma sensação de segurança e satisfação de estar no lugar que estava. Completamente orgulhosa de si, de suas conquistas e das recompensas que elas trouxeram pra sua vida. Logo agora que tudo parecia ter finalmente se encaixado naquela confusa e agitada vida. Eis que ela recebe uma ligação um tanto quanto inusitada, que poderia mudar toda sua vida e por isso fez o seu coração voltar a bater acelerado. Era ELE...que depois de tantos meses sem dar noticias, reaparece do nada, com uma ousada proposta de" fuga". Ele estava de mudança para a Nova Zelânida, e sugeriu que ela fosse com ele, mas ela teria apenas um dia para se decidir(...)

A sensação de segurança aos poucos ia dando lugar a dúvidas e incertezas. Aquelas velhas dúvidas e incertezas que a faziam querer fugir de tudo e ficar, pelo menos por alguns instantes ao lado dele. E mais uma vez, seu mundo saia do lugar, logo quando ela achava que a situação estava completamente sob controle. E ela, mais uma vez, não sabia o que fazer.

Seu coração ficou um tanto quanto inquieto depois desse misterioso telefonema. E mesmo tentando concentrar todas as suas atenções para o grande projeto que começara a desenvolver, ela acabava tendo que se repreender por estar cogitando a idéia de aceitar a proposta . Inúmeras foram as lembranças que invadiram a sua mente e a impediram de se concentrar no trabalho, mesmo com ela fazendo de tudo para esquecer essa "estúpida" nostalgia (pelo menos era o que ela dizia a si mesma para tentar se convencer) e voltar aos negócios. Fazia muito tempo que ela trabalhava para conseguir esse importante projeto e não poderia deixar nada atrapalhar seus planos. NADA E NEM NINGUÉM.

Inúmeros rascunhos do projeto na sua frente. A imagem da face do homem amado na sua mente. Café e remédios sobre a mesa. Lembranças do seu único e verdadeiro amor na cabeça. A caneta sendo usada cada vez mais forte. A voz dele invadindo sua mente cada vez mais próxima...

Ela queria fugir ao encontro dele(...)
Talvez todos já quiseram ao menos uma vez na vida fugir com um grande amor, mas poucos tenham coragem o bastante pra isso.
E ela, com os olhos viajando na tela do computador que refletia a imagem dos calmantes e a chave do carro, sentiasse completamente sem chão e se indagava se teria a coragem necessária para abandonar tudo e ir ao encontro dele. Ela sabia muito bem que se tratava de um caminho sem volta. Se fosse embora naquele momento, sabia que uma nova vida começaria, e tudo que fora conquistado até o momento ficaria pra trás.

Os olhos continuavam viajando. Calmantes, chave do carro, indecisão, atitude, certo, duvidoso. Os olhos pararam por um momento. E o brilho do metal da chave do carro era refletido no brilho do seu olhar. A decisão já estava tomada. Já passava da hora de escolher.E num movimento brusco e ágil, sua mão direita parou sobre a chave do carro. A mão esquerda, livre, serviu para abrir a porta do ármario. Jogou a chave lá dentro, pegou um copo de café, um comprimido e o engoliu. Um talvez fosse pouco, então engoliu outro, só para se garantir.

Sorriu como à muito tempo não sorria, talvez por se achar tão estúpida e idiota a ponto de cogitar a idéia de largar tudo para ir atrás dele. Ela sabia que jamais faria isso. Seu passado com ele não passava disso. De PASSADO. As lembranças aos poucos iam cessando e o seu coração acalmando. O som das teclas do computador foi tomando conta do ambiente. Ela já não o amava mais. Pelo menos não a ponto de renunciar a tudo que já conquistou ...

(Fabiana Nonaka Ferraz)